Fato é que a educação é um
projeto que nunca poderá deixar de ser instituído e aperfeiçoado, implantando-a
e utilizando-a para se alimentar e construir uma sociedade cada vez mais
igualitária e desenvolvida em vários aspectos (economicamente, culturalmente,
politicamente e moralmente, por exemplo), nos parâmetros de um verdadeiro
Estado Democrático de Direito. Tanto é verdade que o projeto foi cuidadosamente
redigito pelo constituinte originário de 1988, ao mencionar, na Carta Maior[1], que:
A
educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e
incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da
pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o
trabalho.
Já dizia o Professor
Pós-Doutor Marcos Augusto Maliska[2] que
“falar em direito à educação é, pois, reconhecer o papel indispensável dos
fatores sociais na formação do indivíduo”, porque os seres humanos, sujeitos
complexos como são, necessitam de vários fatores para serem moldados e
inseridos socialmente, fatores estes que são construídos no íntimo pessoal
desde o nascimento até mesmo no período da terceira idade, como bem exclama
Jean Piaget[3]:
[...]
o desenvolvimento do ser humano está subordinado a fatores de transmissão ou de
interação sociais que, desde o berço, desempenham um papel de progressiva
importância, durante todo o crescimento, na constituição do comportamento e da
vida mental.
Continuando o pensamento de
Jean Piaget, a educação, como direito de fato ela é, constitui um procedimento
formador que leva o emissor a adquirir mecanismos necessários para se elaborar,
projetar e concluir operações de lógica, morais e éticas, surgindo um conjunto
importante de elementos pessoais de vivência social e familiar, ajudando no
convívio interior e exterior do sujeito, desenvolvendo o pleno exercício da
cidadania.
Destrinchando o importante e
já mencionado artigo 205 da Constituição Brasileira, salta-se aos olhos que o
constituinte originário impôs ao Estado[4] e a
família o dever de promover e incentivar a colaboração da educação na
sociedade, visando o pleno desenvolvimento do cidadão, preparando-o para todos
os exercícios da cidadania e à qualificação laboral. Inicialmente, o dever
imposto pela Lei Maior ao Estado se encontra arrolados em todos os sete incisos
e três parágrafos do artigo 208 do mesmo Códex:
Art.
208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:
I -
educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos
de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não
tiveram acesso na idade própria;
II -
progressiva universalização do ensino médio gratuito;
III -
atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência,
preferencialmente na rede regular de ensino;
IV -
educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de
idade;
V -
acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística,
segundo a capacidade de cada um;
VI -
oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando;
VII -
atendimento ao educando, em todas as etapas da educação básica, por meio de
programas suplementares de material didático escolar, transporte, alimentação e
assistência à saúde.
§ 1º -
O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo.
§ 2º - O não oferecimento do ensino
obrigatório pelo Poder Público, ou sua oferta irregular, importa
responsabilidade da autoridade competente.
§ 3º -
Compete ao Poder Público recensear os educandos no ensino fundamental,
fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela frequência à
escola.
Tamisando-se todo o artigo
208, o idealismo constitucional determinou que o Estado atuasse direta e indiretamente
junto às necessidades do universo educacional. De maneira direta, o Estado é
obrigado a organizar e instituir, em consenso de uma administração,
estabelecimentos de ensino público, gerindo toda sua infraestrutura. De maneira
indireta, a educação deve ser instituída por meio de programas e projetos
educacionais, auxiliando na continuação do ensino, como bolsas de estudos,
atividades de intercâmbio, financiamento estudantil, dentre outros.
Em continência, percorrendo o
estudado artigo 205, o outro ente social relacionado pela legislação
constitucional é o ente familiar, onde, em nossa geração de direito, é
entendido não apenas na relação pai-mãe-filho, mas uma relação muito mais
complexa e abrangente[5]. Assim,
como já foi redigido, não apenas o Estado ou a sociedade, mas o ente familiar
possui responsabilidade jurídica e deveres fundamentais em promover à educação
aos seus tutelados.
As consequências da promoção à
educação, conforme o art. 205 da Constituição Federal, é o pleno
desenvolvimento da pessoal, ou seja, a construção subjetiva da personalidade
intelectual e moral do sujeito membro da sociedade, que fará com que surja um
cidadão preparada e visionário dos contornos reais da sociedade – pretérita,
presente e futura – , um cidadão plenamente emancipado para suas atividades
diárias, destacando sobre “uma massa de ignorantes, apática, dirigidos apenas
por emoções e desejos irracionais que, por governantes bem intencionados ou mal
intencionados, sobre a questão do seu próprio destino, é deixada na obscuridade.[6]”,
adquirindo, também, uma qualificação no mercado de trabalhando que, certamente,
somando com uma formação subjetivista bem estruturada, fará com que o sujeito
tenha habilidades intelectuais e morais para um posto de trabalho dignamente
valorativo.
Num caminhar brilhante e
finalizador, Maliska[7],
cronologicamente, doutrina os impactos da educação de qualidade, determinantes
em nossa atual Constituição da República Federativa do Brasil, da seguinte
maneira:
Poder-se-ia
dizer que a Educação (i) é um instrumento permanente de aperfeiçoamento
humanístico da sociedade; (ii) promove a autonomia do indivíduo; (iii) promove
a visão de mundo das pessoas, a forma como elas vão ver os acontecimentos na
sua cidade, no seu país e no mundo. Ela deve ter a função de superadora das
concepções de mundo marcadas pela intolerância, pelo preconceito, pela
discriminação, pela análise não crítica dos acontecimentos; (iv) promove o
sentimento de responsabilidade nas pessoas para com o mundo que vive, o
sentimento de que o mundo que está a sua volta é um pouco resultado de suas
próprias ações; (v) promove a consciência de que viver em uma república não
implica apenas desfrutar direitos, mas também compreende responsabilidades
cívicas e (vi) promove a consciência pelo valor dos direitos individuais e
sociais.
NOTA DA REDAÇÃO:
Getúlio Costa Melo é advogado atuante em Barbacena. Pós-graduando em Docência
no Ensino Superior pela Universidade Senac e em Direito Tributário pela
Universidade Anhanguera-Uniderp. Bacharel em Direito pelo Centro de Estudos
Superiores Aprendiz. Acesso ao currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/4887518407176352
[1]
Art. 205 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
[2]
MALISKA, Marcos Augusto. Comentário ao art. 205. In: CANOTILHO, J. J. Gomes;
MENDES, Gilmar F.; SARLET, Ingo W.; STRECK, Lenio L (Coords). Comentários à
Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva/Almedina, 2013, p. 1964.
[3]
PIAGET, Jean. Para onde vai a educação?. Tradução portuguesa por Ivette Braga.
Rio de Janeiro : José Olympio Editora, 1973, p. 35.
[4]
Quando mencionado o Estado, entenda-se que é papel, não somente do Poder
Público como um todo, mas um dever, também, de cada participante, ou não, da
sociedade brasileira, haja vista que o interesse à educação, principalmente de
crianças e adolescentes, é colocado em patamar de importância nacional e
internacional. A título de conhecimento, a própria Declaração Universal dos
Direitos Humanos, de 1948, declara que a educação é um importante mecanismo
para se garantir os direitos à dignidade da pessoa humana e todos os demais
princípios acordados pelos membros signatários da Organização das Nações Unidas
– ONU.
[5]
“[...] se verificou que o modelo institucionalizado de família, monolítico,
previsto no Código Civil de 1916, não mais atendia aos anseios sociais, sendo
necessário oferecer proteção jurídica às novas formações (art. 226, §§ 3ª e 4ª,
CF/88). A multissecular tutela exclusiva da família fundada no casamento
indissolúvel deu lugar à proteção de relações familiares instrumentais, em que
cada filho pode ser planejado (art. 226, §7ª, CF/88) e cada membro tutelado em
si mesmo (art. 226, §8ª, CF/88), mesmo se em detrimento da instituição. Como as
Constituições brasileiras anteriores limitaram-se a tutelar o casamento, embora
ao longo do tempo se tenha verificado paulatina proteção aos filhos nascidos
fora do casamento, constata-se que a história constitucional brasileira jamais
protegeu as relações familiares de modo tão amplo e efetivo.” – MORAES, Maria
Celina Bodin de; TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado. Comentário ao art. 226. In:
CANOTILHO, J. J. Gomes; MENDES, Gilmar F.; SARLET, Ingo W.; STRECK, Lenio L
(Coords). Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva/Almedina,
2013, p. 2114.
[6]
HESSE, Korand. Elementos de Direito Constitucional da República Federal da
Alemanha. Tradutor Luís Afonso Reck. Porto Alegre: Fabris, 1998, p.133.
[7]
MALISKA, Marcos Augusto. Comentário ao art. 205. In: CANOTILHO, J. J. Gomes;
MENDES, Gilmar F.; SARLET, Ingo W.; STRECK, Lenio L (Coords). Comentários à
Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva/Almedina, 2013, p. 1965.
Ilustre Fernando Lima, meu amigo. Muitíssimo obrigado pela disponibilidade em publicar o meu humilde texto no seu Blog. Forte Abraço!!
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